19.4.08

À luz do poente




Há pouco
Estando olhando o mar,
Tive um desejo louco
De nele me deitar.

A água tão quieta,
Tão limpa e cintilante,
Punha-me pena de não ser poeta
Um só instante,
Para montar-lhe o dorso e ir o mundo fora
Tangendo as leves ondas;
Cantando a luz da Aurora
As pálidas giocondas,
E a grande desventura
Dos que ela enfeitiçou
E numa noite escura
Sepultou…

Dourando-a de revés,
O sol descia lentamente,
E havia no poente,
De quando em vez
hesitações de ouro
Que punham um brando coro
De nostalgia
Nas folhas mais erquidas do arvoredo
Que oscilando a medo
Olhavam tristemente o fim do dia…

E então
mesmo vestido
Vencido o coração,
Vencido o meu sentido,
Eu fui entrando, pouco a pouco,
Lentamente…
E ali me pus nadando como um louco
À luz do poente…


Rui de Noronha
Moçambique