Ai, Chiloa, o milheiral perdido!
O chá, o arroz e até ao amendoim,
As bananeiras tragadas pelo rio,
Que também nos veio roubar vaca matu.
Ai, Chiloa, o rio tem Chicuembe.
Porque nem mesmo as orações dos crentes,
Aqueles teus irmãos lá da missão,
Conseguiram salvar as plantações.
Ai, Chiloa, o rio veio-nos despir
E nos levou os montes de sisal
Que raposa Monhé, ladrão do sangue
Dos plantadores nossos bons irmãos,
Nos pagaria a peso do algodão!
Ai, Chiloa, antes me levasse o rio
Na lama das suas águas pardacentas
E um veleiro gigante me abarcasse
Com rumo à cidade do sol e amor!
Ai, Chiloa, iria sem uma mainata
Ou trabalhar de noite na estiva
Dos enormes cargueiros estrangeiros
Que ao longe, no mar, vemos cruzar!
Hei-de ver mais de mil carros iguais
Ao do teu padre Cruz, lá da missão.
Hei-de ver meus amigos magaíças
E pedir-lhes tabaco do Transval!
Ai, Chiloa, mas eu não quero ir!
Não posso aqui deixar-te tão sozinha!
Espero que as águas fujam para longe
E o sol de novo brilhe mais ardente!
Vou deixar fugir esta tristeza,
Que mora nos teus olhos e nos meus.
Vou deixar morre esta amargura
Que em nossos corpos entranhada vive.
Pegarás na enxada e cavarás
Com mais denodo ainda nossos campos.
O milheiral dar-nos-á mais milho!
Teremos mais arroz e mais sisal!
Ai, Chiloa, a cheia engoliu tudo
Menos a persistência dos teus braços,
A carícia doce de teus olhos,
E o esforço futuro dos teus filhos.
Virgílio de Lemos
Moçambique
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