Cesário andava pela cidade com plantas
silvestres metidas na cabeça
Irrompiam-lhe nas calçadas no repuxo das fontes
no grito das varinas no trote das patrulhas
Ninguém sabe contudo que em fidelíssimo segredo
deixou outro livro do qual Silva Pinto nada soube
Nem o Caeiro da planta é uma planta é uma planta
que se apanhasse fechava-o à chave na arca
para girândolas futuras dos casmurros das Universidades
Mas nada de suspense O livro é apenas um herbário
todo rechonchudo de coisas trivialíssimas
como a receita para lavar manchas de amora nos bigodes
ou de como arrancar sem dor cucos de tojo que um dia
lhe pegaram uma coceira dos infernos Depois há folhas
e folhas amarelecidas de chuvas-de-oiro mongaricas
urzes torgas estevas-dos-saloios sarças
alecrins alfenas lentiscos e loendros
Um nunca acabar Ao lado de um esparto
a nota: tenho o pulso como um cajado de pastor
e meus dedos amadurecidos como um céu de Verão
Assim se sentimentaliza um ocidental
Confiar como? Se quando menos se precata
salta ou voa sobre a Dor humana
e as marés de fel como um sinistro mar?
Folhear o herbário é vê-lo como abria as portas
A toda a moscaria É vê-lo esquecer-se da Cólera
E da Febre Ver como deixava que a terra lhe marinhasse
Como um vinho de fogo pelo exangue corpo acima
E ver isso é bom Admirar-lhe os ouvidos
encostados ao sol à escuta que os estames
e pistilos se pusessem a ferver O pólen
a descer o corrimão da luz até cobrir de um certo oiro
a sombra pisada da sua melancolia O vinho
a espirrar numa chuva muda de palavras
Coisa estranha: o cântico de um homem
expresso em folhas secas caules flores
breves notas num herbário como: é meu irmão
o entrecasco de sobro bom para a taninagem
As maçãs de espelho não andam bem empapeladas
Fica-lhes mal o verde e a serradura
Alexandre Pinheiro Torres