Decididamente,
aqui é o reino das garças.
São elas talvez, de tão tranquilas,
a chave do enigma
deste lugar de raríssimos rumores.
Algumas já se habituaram
ao tráfego dos barcos:
olham maquinalmente,
como um obreiro que cumpre
o dever fastidioso de contar
coisas que transitam
– cestos de uvas, barcos, horas,
outras aves –,
sem ordem do patrão
para abandonar o posto de vigia.
Outras, timoratos riscos brancos,
vê-se que temem o contágio dos poetas,
põem-se em fuga,
sobrevoando os juncos.
E eu a bordo sigo as garças:
às vezes sou a que fica,
às vezes sou a que voa.
A. M. Pires Cabral