O poeta é um fingidor
Fernando Pessoa
Fernando Pessoa
Quando chegar à Lua, hei-de encontrar,
na fria alcova de árida cratera,
a verde selenita que me espera,
gota final de algum extinto mar.
Terei então cem anos? Um milhar?
Ou mais talvez, além da nossa era...
E ela será botão de primavera
que sem pólen não chega a despertar.
Eu darei saltos de acrobata, ao vê-las,
às algas dos seus dedos, a alongar-se
em railes a caminho das estrelas...
Desceremos os dois, porém, uma curva,
onde o mistério se abre, sem disfarce,
para a face da Lua funda e turva.
(in «Moço, Bengala e Cão»,
edição do autor, 1971)
Adolfo Simões Muller