22.2.08

Flor sem haste



Menina pobre, eu venho agradecer-te

Aquele sorriso bom que me inspiraste,

Quando te vi na rua e julguei ver-te

À flor dum rio, como flor sem haste.

Balouçavas as mãos, como quem vai

Numa estrídula marcha militar.

E um laço nos cabelos, cai-não-cai,

Fugia do compasso, a ralentar.

Passavas pelas montras, como se

Todas as coisas conhecesses bem;

Ou, para alguma teres, pensasses que

Bastaria pedi-la à tua mãe.

Séria. – Somente em teu olhar brilhava

Uma alegria de quem viu no céu

A nuvem mais bonita que lá estava

E o anjo que atrás dela se escondeu.

O que os outros pensaram dos teus modos,

Que importa? Nem teu nome ou tua idade.

Eu venho agradecer-te por nós todos

Essa lição de naturalidade.

Que tu nos destes, ó fresca flor sem haste,

À flor da rua, como á flor dum rio.

- Menina pobre que por nós passaste,

Que tanta gente olhou e ninguém viu.


Carlos Queirós