É a quarenta quilómetros no meio do mato
Aqui estou
e aqui páro
O sol cai a prumo verde e ouro misturado
sobre mim
e os outros claro
É de novo o tempo de anos e anos
e de novo carrego nos ombros o silêncio tanto
riscado de trilos sem mácula modulados como
crispado de uma súbita pausa
Caminho pelo riacho seco de lages com quartzo
e o tacão afunda-se no matope raso
e aqui páro
e os meus olhos sobem à última ramada
pela árvore que me é ao lado
e uma seiva comum insuspeitada
rodeia-me de borboletas brancas
que me tocam a face
O hálito da terra morna
segreda por todo o lado
e do ombro do negro de m'cota
soltam-se fios de água
Eu sorrio de súbito ao anúncio
de uma possível lágrima
e as crianças encostadas à pedra talhada
repartem comigo um riso rápido
Os outros criam indispensáveis imagens
intercalando palavras ao sábio cântico dos pássaros
e eu reparo
que a última borboleta branca me há deixado
É a quarenta quilómetros no meio do mato
que hoje estou sepultada
Glória de Sant'Anna
Moçambique
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