23.9.07


Panteísmo

Ao Botto de Carvalho


Tarde de brasa a arder, sol de verão
Cingindo, voluptuoso, o horizonte...
Sinto-me luz e cor, ritmo e clarão
Dum verso triunfal de Anacreonte!


Vejo-me asa no ar, erva no chão,
Oiço-me gota de água a rir, na fonte,
E a curva altiva e dura do Marão
É o meu corpo transformado em monte!


E de bruços na terra penso e cismo
Que, neste meu ardente panteísmo
Nos meus sentidos postos e absortos


Nas coisas luminosas deste mundo,
A minha alma é o túmulo profundo
Onde dormem, sorrindo, os deuses mortos!


Florbela Espanca