O desenho impreciso
            De cada rosto humano, reflectido!
            Mas, o velho Narciso
            Continua fiel e debruçado
            Sobre o ribeiro…
            Porque há-de ver-se inteiro
            Quem todo se deseja revelado?
Devorador da vida lhe chamaram,
A ele, artista, sábio e pensador,
            Que denodadamente se procura!
À movediça e trágica tortura
De velar dia e noite a líquida corrente
            Que dilui a verdade,
            Quiseram-lhe juntar a permanente
            Ironia
            Desse labéu de pérfida maldade
            Que turva mais ainda a imagem fugidia…
Miguel Torga

 
