Aquela que dormirá comigo todas as luas
           É a desejada de minha alma.
           Ela me dará o amor do seu coração
           E me dará o amor da sua carne.           
Ela abandonará pai, mãe, filho, esposo
           E virá a mim com os peitos e virá a mim com os lábios
           Ela é a querida da minha alma
           Que me fará longos carinhos nos olhos
           Que me beijará longos beijos nos ouvidos
           Que rirá no meu pranto e rirá no meu riso.
           Ela só verá minhas alegrias e minhas tristezas
           Temerá minha cólera e se aninhará no meu sossego
           Ela abandonará filho e esposo
           Abandonará o mundo e o prazer do mundo
           Abandonará Deus e a Igreja de Deus
           E virá a mim me olhando de olhos claros
           Se oferecendo à minha posse
           Rasgando o véu da nudez sem falso pudor
           Cheia de uma pureza luminosa.
           Ela é a amada sempre nova do meu coração
           Ela ficará me olhando calada
           Que ela só crerá em mim
           Far-me-á a razão suprema das coisas.
           Ela é a amada da minha alma triste
           É a que dará o peito casto
           Onde os meus lábios pousados viverão a vida do seu coração
           Ela é a minha poesia e a minha mocidade
           É a mulher que se guardou para o amado de sua alma
           Que ela sentia vir porque ia ser dela e ela dele.           
Ela é o amor vivendo de si mesmo.
           É a que dormirá comigo todas as luas
           E a quem eu protegerei contra os males do mundo.           
Ela é a anunciada da minha poesia
           Que eu sinto vindo a mim com os lábios e com os peitos
           E que será minha, só minha, como a força é              do forte e a poesia é do poeta.           
          
Vinícius de Moraes (poeta brasileiro)

 
