Errância
A voar por cima de  Samarcanda,
   Aceno à súbita memória
   De meus avós almocreves
   Que, por acaso, nunca  aqui passaram
   Quando iam ao Porto
   Em machos guizalheiros,
   E onde comiam tripas, a  buscar as especiarias de lá.
   De primeira classe, num  avião francês,
   A enjoar champanhe e  caviar,
   Vou a Macau falar de  Camões.
   Em nome dele, e por eles,
   Obreiros dum império de  ilusões,
   Vou, como novo andarilho,
   Garantir ao futuro que  Portugal
   Terá sempre o tamanho  universal
   Da infinda inquietação de  cada filho.
Miguel Torga

 
