Como ladrão ou mulher 
pública: vens de noite. 
Trazes o harmónio, 
a masculina
música roubada às fontes.  
Não te esperava: só uma vez 
te esperei tremendo de amor: 
eu era tão pequeno 
que nem me viste.
Nem uma palavra ousas;
só os olhos suplicam que te roube 
à morte, que devolva ao sol 
a modesta desordem dos teus dias.
Que escute ao menos a pobre 
e rouca e desamparada 
música do teu pequeno harmónio.
Eugénio de Andrade

 
