30.1.11

Nunca sei



Aqui a vi os cabelos concertando;
ali, co a mão na face, tão fermosa;
aqui, falando alegre, ali cuidosa;
agora estando queda, agora andando.

Camões, «Quando o sol encoberto vai mostrando»



Às vezes sorris, às vezes gritas,
às vezes caminhas sossegada pela casa.
Às vezes acordas com o rosto no meu braço,
às vezes fere-me no sono o teu joelho.
Já te observei deitada à beira do mar,
contigo andei pela clareira das florestas,
pequei-te na mão e fomos ao cimo das montanhas.
A chorar estiveste deitada nos meus braços.

Nunca sei onde estás, onde tu foste,
nunca soube se conseguia inquietar-te.
Passam as estações por nós, tu envelheces.
Dos sítios onde estivemos ficou-me que recordação?
Um dia morrerás. E quem pode adivinhar
que por ser incapaz de entender o mistério
passei a minha vida a estudar os teus gestos?


João Camilo