17.10.11

A caminhada



Nessa mata ninguém mata
a pata que vive ali,
com duas patas de pata,
pata acolá, pata aqui.

Pata que gosta de matas
visita as matas vizinhas,
com as suas duas patas
seguidas de dez patinhas.

E cada patinha tem,
como a pata lá da mata,
duas patinhas também
que são patinhas de pata.


Sidónio Muralha

15.10.11

Como são belos


Como são belos os teus seios!
Foram feitos
à medida das minhas mãos.
Pousa-os
na minha boca e conta-me
a tua história.
Não tens história?
Não tens noite nem vazio nem praia
branca?
Fala-me então
do sol, da migração dos pássaros, da mansidão
das estrelas - fala-me de ti antes de possuíres
um nome, uma história.
Sim
em qualquer parte
lançaremos os nossos corpos na relva;
alfaias efémeras; armas exíguas
ardidas na guerra.
Como são belos os teus seios!
Trémulas palavras.
Deixa que neles eu me queime como quem
se deita num rio.
Sinto a terra mover-se.
Iluminas as águas e as estrelas.
O percurso é longo.
O silêncio montanhoso.
Debruço-me
na tua solidão.


Casimiro de Brito

14.10.11

Soneto à tua volta



Voltaste, meu amor... enfim voltaste!
Como fez frio aqui sem teu carinho....
A flor de outrora refloresce na haste
que pendia sem vida em meu caminho.

Obrigado... Eu vivia tão sozinho...
Que infinita alegria, e que contraste!
-Volta a antiga embriaguez porque voltaste
e é doce o amor, porque é mais velho o vinho!

Voltaste... E dou-te logo este poema
simples e humilde repetindo um tema
da alma humana esgotada e envelhecida...

Mil poetas outras voltas celebraram,
mas, que importa? – se tantas já voltaram
só tu voltaste para a minha vida...


JG de Araújo Jorge
Brasil

11.10.11

3


Aberta
estende
reclama
ternura

Frágil
de palma voltada

Quando se fecha
sobe no braço
é arma apontada


António Borges Coelho

Já não sabes como os filmes de papel



As letras azuis cor de mármore
são as veias cinzentas
que me atraem...
são cabelos ocos entrelaçados
por areia
e um cheiro a maresia
com rodapés de escarlate
e salmão
Sopro por entre cadeiras
assentes no chão
Razei a soma cabal
do esguio
e lânguido rosto
de cristal...
que se esgueirava
por entre dedos
e tijoleiras
As carnes com que prendia
os teus seios eram aquelas
que sabiam a sal
e onde navegam por
entre pedras soltas
e saltitantes esqueletos
ainda rebolas

e contornas
com grande perícia
os sinais de interrogação,
esses são órbitas,
teus livros
rasgados
com páginas amareladas
Vives em casas entreabertas
de medos, em que pintas
as tuas neuroses
com detalhes perfeccionistas,
em que tentas esculpir
as luzes psicóticas
dos barcos à deriva
cambaleias nessa névoa de cinzel
com barras tricolores
onde espelhos teus
encerram os meus temores...
Já não sabes trilhar
com remos partidos
Já não sabes
como os filmes de papel
És igual às outras
do princípio até mim...


Fernando Ramires

9.10.11

Rosa murcha


_ «Quarenta anos fez ontem (sexta-feira
«Da Paixão do Senhor!) a mulher doce
«Que há oito dias para aqui me trouxe
«Da minha verde e maternal roseira.

«Amou com vivo amor... e está solteira!
«Sua trança doirada desdoirou-se,
«E chora como as fontes! Antes fosse
«Em tranquilo convento ingénua freira!

«Ontem, no seu jantar sem convidados,
«Sem sobremesa, silencioso e curto,
«Só conversava com o relógio velho...

«E erguendo os olhos, d'água marejados,
«Para mim, murcha rosa, olhava a furto,
«Como se eu fosse em frente dela um espelho!

Eugénio de Castro

7.10.11

Lucinda


Ergue a frente, lírio,
Ergue a branca frente!
O astro do delírio
Já surgiu no oriente.

Vês, o sol ardente
Lá caiu no mar;
A frente pendente
Ergue a respirar!

Alvo é o luar,
Teu alvor não cresta;
A hora de gozar,
De viver é esta.

Longa foi a sesta,
Longo o teu dormir;
Ergue a branca testa,
Tempo é de surgir!

Já se abre a sorrir
Tua boca linda...
Despertar, sentir
Ou sonhar é ainda?

Sonho que não finda
Será o teu sonhar,
Se a dormir, Lucinda,
Te sentes amar.


Almeida Garrett

2.10.11

O bar


Andei com Maiakovsky a servir
sumos de ananás num Bar de putas.
Por essas noites, a noite cheirava a mijo
e a ódio. Sim, a mijo e a ódio.
Um homem costumava entrar
e perguntar pelo seu irmão.
Nunca estava. O seu irmão
nunca estava e, então, o homem
desaparecia
sem mais interrogações.
Um dia houve uma guerra num vaso de flores
e na noite desse dia o Bar fechou.
Reabrimos na noite seguinte
muito orgulhosos da nossa guerrazinha
que continuava, mas agora
de certo modo longe do nosso local de trabalho.
Voltámos a servir sumos de ananás
regularmente. Maiakovsky
não usava meias desde a guerra
e as putas quase sempre comentavam isso.
Constou nessa altura
que tinha morrido como um valente
o homem que costumava entrar
e perguntar pelo seu irmão.
Confirmámos isso quando o irmão dele passou a frequentar o Bar
sem fazer uma única pergunta.
De vez em quando tínhamos de pôr fora
os clientes que se embebedavam.
Alguns, no auge da noite,
pretendiam ser Deus,
outros,
faziam discursos que irritavam os chulos
diziam coisas tremendas
e um deles era um general de cavalaria
que ao terceiro copo já queria vender as esporas.
No último verão houve a crise do ananás
e passámos a servir batidos de morango.
As putas adoravam.
Maiakovsky olhava de soslaio umas vezes,
outras, pelo cantinho do olho
e fazia-me sinais.
Eu levantava geralmente os cinzeiros e as gorjetas
Enquanto ele passava um pano húmido
Pelo tampo das mesas.
Dividíamos desta maneira o nosso trabalho
porque ele era alérgico ao cheiro das notas
e a mim dava-me prazer
ajudá-lo no que pudesse.
Uma tarde veio num jornal que ele tinha morrido.
Nem ele próprio acreditou.
Ficou desiludido, muito desiludido mesmo
e confessou-mo.
Não chegou a haver entrevistas, fotógrafos, nada.
Ele fez as malas calmamente
(e, no entanto, esqueceu-se de uma gravata),
abraçou-me e partiu com
lágrimas nos olhos.
Então, sozinho, abri o Bar apenas
uma ou outra noite em que senti saudades.
Por vezes entravam turistas americanos
que me ofereciam somas terríveis
pela cadeira onde ele costumava sentar-se
nos nossos dias de folga.
Quase nunca chegava a responder.
Eles percebiam o meu olhar e não diziam nada,
não insistiam mais.
O mesmo acontecia com as putas,
que deixaram de fazer-me perguntas.
Creio que agora estou desempregado.
Fechei o Bar definitivamente.
Muita coisa mudou embora as noites
continuem hoje a cheirar
a mijo e a ódio.
Faleceu o general
que negociava as esporas ao terceiro copo,
Deus caiu abaixo da sua bebedeira,
e eu acabei por vender a cadeira do meu camarada
que está agora algures no Colorado atrás de uma secretária
num Boss Office de uma fabriqueta de pastilha elástica.
Estou mais novo
e vou sobrevivendo a todas estas recordações.
Mas quando agora saio por aí, de noite, roído de saudades,
já nem mesmo as putas,
as mesmas putas,
me reconhecem.


Joaquim Pessoa

30.9.11

palavras bonitas como a palavra mágica.


palavras bonitas como a palavra mágica.
nascente uma palavra moça, recorrente.

palavra menstrual, rosada.
a rigor o mês assiste o vocabulário
da permuta,

a palavra volúpia teu sexo repleto de pássaros
notas mágicas de teus olhos cheios de plan(e)tas
muitas palavras por dizer ou rasgar
quando comes os frutos ensopados;

quando do fruto tens palavra sentir: formas e dores;
e caber na forma palavra nutrir.


João Tala
Angola

19.9.11

Clara Onda



Este amor em meadas e triciclos
que nunca se divide, confluindo
e torna noite, este sapato findo
e o firmamento, silencioso ciclo.

Este amor em meadas, infinito.
Em meadas de orvalho, desavindo,
em meadas e quedas, rugas, trincos
e rusgas, trinos, pios e sóis contritos.

Este amor me retece e configura.
Tem pressa de crescer, fogo calado.
Apenas queima, quando não se apura.

Parece interminável, quando tomba.
E só se apura, quando despertado.
Dissolvido me solve em clara onda.


Carlos Nejar
Brasil

17.9.11

Antilírica heróica



o que é isto a voz suturada nas
quatro esquinas da boca o que é isto
são os olhos o corpo sua eterna
ebulição?

o que é isto as mãos as mãos crescem
como as folhas rompem a pele
rouca do clamor: sua
ferocidade?

o que é isto o que é isto fere-se
a larva o presságio dos vivos: terra
que estala atrás dos
lábios?

o que é isto o hálito a língua
do vento frequente no rosto na sombra
nas pernas do herói: e o herói vai
o herói vai morto.


David Mestre
Angola

16.9.11

Decálogo



o húmus na esperança da terra:
eis o pão!

a carícia nos dedos do vento:
eis a água!

a liberdade na paz dos homens:
eis o trabalho!

a estrela no murmúrio da fonte:
eis o pensamento!

o amor no leite da mulher:
eis a poesia!

o direito no sol do mundo:
eis a justiça!

o equilíbrio na paz dos astros:
eis a ciência!

a harmonia no silêncio do mar:
eis a música!

a luz no calor do sangue:
eis a pintura!

o segredo na voz da floresta:
eis a imaginação!


António Cardoso
Angola

15.9.11

Adormecer assim


Adormecer
assim: inclinado
sobre um rio
em repouso.
A mão esquerda
caída em palma
no crânio; a boca
no ombro no aroma
da pele; o joelho
e a mão direita
na coxa no canteiro ainda
molhado. Acordar assim: ouvir
o breve adágio do corpo amado
a respiração pouco a pouco mais tumultuosa
sob os lençóis subitamente visitados
pelo sol da manhã.


Casimiro de Brito

14.9.11

Canto integral do amor


Cegos os olhos, continuarias de qualquer forma, presente,
surdos os ouvidos, e tua voz seria ainda a minha música,
e eu mudo, ainda assim, seriam tuas as minhas palavras.

Sem pés, te alcançaria a arrastar-me como as águas,
sem braços, te envolveria invisível, como a aragem,
sem sentidos, te sentiria recolhida ao coração como
o rumor do oceano nas grutas e nas conchas.

Sem coração, circularias como a cor em meu sangue,
e sem corpo, estarias nas formas do pensamento
como o perfume no ar.

E eu morto, ainda assim por certo te encontrarias
no arbusto que tivesse suas raízes em meu ser,
- e a flor que desabrochasse murmuraria teu nome.


JG de Araújo Jorge
Brasil

11.9.11

Beija-me



Beija-me com os beijos da tua boca.
Tuas carícias melhores do que o vinho.
E sê-me luz. Luz total. E água.
Profunda água pelo fogo enamorada,
terra que grita exasperada plenitude.
E frescura. Fecundidade.
Árvores frondosas, ramagens,
verde iluminado,
primavera, enfim.

Que aroma de ti parte? Olor a fruto?
Tua pele é jasmim?
Flor de pura laranjeira?
Pétala de alfena e de nardo?
Oh! Tudo! Tudo em ti é perfume
quando ondeias o corpo lindo!
Teus lábios destilam mel,
teus cabelos a essência feliz do rosmaninho.
És carne, apenas?
Mas sem ti como
explicar a razão de haver no mundo claridade?


Gonçalo Salvado

8.9.11

Afirmas que brigamos


Afirmas que brigamos. Que foi grave.
Que o que dissemos já não tem perdão.
Que vais deixar aí a tua chave
E vais à cave içar o teu malão.

Mas como destrinçar os nossos bens?
Que livro? Que lembranças? Que papel?
Os meus olhos, bem vês, és tu que os tens.
Não te devolvo – é minha – a tua pele.

Achei ali um sonho muito velho,
Não sei se o queres levar, já está no fio.
E o teu casaco roto, aquele vermelho
Que eu costumo vestir quando está frio?

E a planta que eu comprei e tu regavas?
E o sol que dá no quarto de manhã?
É meu o teu cachorro que eu tratava?
É teu o meu canteiro de hortelã?

A qual de nós pertence este destino?
Este beijo era meu? Ou já não era?
E o que faço das praias que não vimos?
Das marés que estão lá à nossa espera?

Dividimos ao meio as madrugadas?
E a falésia das tardes de Novembro?
E as sonatas que ouvimos de mãos dadas?

De quem é esta briga? Não me lembro.


Rosa Lobato Faria

7.9.11

Vinha Podada



Sonha a vinha podada.
Sonha calma, gelada,
Pâmpanos de primavera universal.
Sonha, numa recôndita modorra,

Uma aberta desforra
Em vides de tamanho natural.
Sonha como quem dorme repousado
Na certeza da seiva e da razão;

Sonha como quem sabe que o seu fado
Tem apenas as leis da ocasião.
Sonha contra as muralhas altas, ocas,

Que são nuvens de pé sobre o horizonte:
Porque o céu há-de abrir-se quando as bocas
Beberem mosto como numa fonte.


Miguel Torga

Retrato



(NUM ÁLBUM)

Ah!, despreza o meu retrato
Que lhe eu queria aqui pôr!
Tem medo que lhe desfeie
O seu livro de primor?

Pois saiba que por despique
Eu sei também ser pintor:
Co’esta pena por pincel,
E a tinta do meu tinteiro,
Vou fazer o seu retrato
Aqui já de corpo inteiro.

Vamos a isto. - Sentada
Na cadeira moyen âge,
O cabelo en châtelaines,
As mangas soltas. - É o traje.

Em longas pregas negras
Caia o veludo e arraste;
De si com desdém régio
Com o pezinho o afaste ...

Nessa atitude! Está bem:
Agora mais um jeitinho;
A airosa cabeça a um lado
E o lindo pé no banquinho.

Aqui estão os contornos, são estes,
Nem Daguerre lhos tira melhor.
Este é o ar, esta a pose, eu lho juro,
E o trajar que lhe fica melhor.

Vamos agora ao difícil:
Tirar feição por feição;
Entendê-las, que é o ponto,
E dar-lhe a justa expressão.

Os olhos são cor da noite,
Da noite em seu começar,
Quando inda é jovem, incerta,
E o dia vem de acabar;

Têm uma luz que vai longe,
Que faz gosto de queimar:
É uma espécie de lume
Que serve só de abrasar.

Na boca há um sorriso amável.
Amável é... mas queria
Saber se é todo bondade
Ou se meio é zombaria.

Ninguém mo diz? O retrato
Incompleto ficará,
Que nestas duas feições
Todo o ser, toda a alma está.

Pois fiel como um espelho
É tudo o que nele fiz,
E o que lhe falta - que é muito,
Também o espelho o não diz.

Almeida Garrett

Dedicatória


Teus dedos
vadios
colhendo flores
na renda
dos meus

recordarei de
pois quando
noutros dedos
tocava
os teus


David Mestre
Angola

6.9.11

Entardecer na praia da luz



Espreguiçados, os ramos
das palmeiras filtram
a luz que sobra
do dia. É já noite
nas folhas. O branco
das paredes recolhe
o sangue e o vinho
das buganvílias
e hibiscos. Bebe-os
de um trago: saberás
que, mais do que cegueira, a noite
é uma embriaguez perfeita.


Albano Martins

3.9.11

Outras vozes me chegam da cratera


outras vozes me chegam da cratera
de uma flor de uma casa de uma agulha
e murmuram os nomes do verão
e ancoram seus barcos de veludo

outras vozes se vestem de infintio
abertíssiomo chão sem armaduras
vacilantes os pés na orvalhada
semente da maçã à noite ao escuro

outras vozes arriscam outro grito
um turbilhão de aragem delirante
na bárbara visão impossuída

outras vozes se escondem na loriga
com que marte se cobre quando entende
certas vozes da tua mão na minha


Olga Gonçalves

2.9.11

Ideário para a criação



Quando, em ti próprio, ouvires algum combate
do sonho em luta com a sua própria alma
e o mundo te parecer maior que a vida
e a vida te parecer a velha estrada
onde só tu não perseguiste o sonho,
defende, de ambos, o que for vencido.

Quando, à tua beira, houver um perseguido
e o escárneo se abater sobre o que ele pensa
e o mundo inteiro o perseguir mentindo
uma mentira maior que a dessa ideia,
defende-a como tua antes que o mundo
esmague em si próprio a chama em que se ateia.

Quando, como hoje, os crimes forem tantos
que as praias sequem no desdém das ondas,
e o melhor homem for um criminoso
voltando ansioso ao local do crime,
e o sangue nem lhe suje a ansiedade
porque não há mais sangue que ciências loucas,
grita aos ventos da morte que os traíram -
e na terra se ouça que a verdade é falsa
e só eram verdade os que partiram.


Jorge de Sena

30.8.11

Das frutas noite e dia



(Reabre-se o pano: Eis que frutal e louco,
ele entra em cena para fazer o madrigal.
Imagina-se o diálogo das frutas entrelaçadas no cesto.
Mais arfantes do que plásticas, elas se permitem à fala)

Solfejo no gosto de pitanga o acordar contigo
O arfar fruído, quando não tão-só flutuante
- e há de o sol descrever seu arco no diurno -,
Em que as horas soluçantes se perdem…

Dou graças ao cajá e à fruta-do-conde, a terra,
O vento, a água, o ar e o arfante deste animal,
Medusa, como dizes, que petrificas de olhar,
Para além das cobras do teu “dread”…

Cai a noite e, de brumosa tocatina, dançam
Os pés que, embebidos no teu pântano, és tu
Virada pelo avesso, manga rosa e seu reverso…

E quando, em carnuda, me mordem os lábios,
desfeito em rosa manga, de laço e de caroço, eu
amanheço, resinado e pura fruta, nesse leito…


Filinto Elísio
Cabo Verde

São estas diferenças que partilho



São estas diferenças que partilho:
eclesiástica palavra tu és uma igreja

nutrida uma palavra
espiga outra palavra

levantas-me escolástica o nervo
com a tua dor;
aurora com o teu lume,

álgebra inquieta não somarias
o tempo que não partilho.


João Tala
Angola

29.8.11

Amor feinho


Eu quero amor feinho.
Amor feinho não olha um pro outro.
Uma vez encontrado, é igual fé,
não teologa mais.
Duro de forte, o amor feinho é magro, doido por sexo
e filhos tem os quantos haja.
Tudo que não fala, faz.
Planta beijo de três cores ao redor da casa
e saudade roxa e branca,
da comum e da dobrada.
Amor feinho é bom porque não fica velho.
Cuida do essencial; o que brilha nos olhos é o que é:
eu sou homem você é mulher.
Amor feinho não tem ilusão,
o que ele tem é esperança:
eu quero amor feinho.

Adélia Prado
Brasil