11.12.10

Essa estrada que passa à minha porta


Bem junto do portão
da minha Torre branca de Marfim
silente e pequenina,
que brilha, intensamente, ao sol de verão
como gota de orvalho cristalina
nas folhas dum jasmim,
passa uma estrada
que tem nas valas rosas-de-toucar.
Via suave, ainda não trilhada,
que ninguém sabe, não, onde vai dar!

Um camponês velhinho,
de negra tez e fronte recurvada,
cabelos brancos, mais que o branco linho
que a moça dobra em horas de lazer,
me disse que nascera aquela estrada
ali, na hora em que me viu nascer.
Contava mais caminhos de montanha
do que estrelas o céu pode contar,
mas essa estrada lisa, assim tamanha,
nunca soubera, não, onde ia dar!

Aéreo sonhador
− um misto de Pierrot e de Arlequim −
à luz do sol que aquece e me desvela
já vão vinte anos que parti por ela,
há dez não vejo a Torre de Marfim!
A ocultar-me o passado − que se esfuma
numa saudade que faz mal à gente −
e a esconder-me o futuro até ao fim,
há uma cortina azul de fina bruma
que, penosa, se arrasta à minha frente
e, insondável, se estende atrás de mim!
Há vinte anos caminho, no entretanto,
ora abatido, ora de novo audaz;
ou vendo o fim tão longe, num quebranto,
com mil desejos de voltar atrás.

Ora tropeço e caio e vou seguindo
desalentado já deste medonho,
intérmino correr, ora vou rindo,
na mente a abrir a flor dum novo sonho.

Da minha Torre branca de Marfim
há vinte anos parti, brilhante o olhar,
buscando o fim da estrada que, sem fim,
não sei, eu próprio, ainda, onde vai dar.

Álvaro Feijó