Acordei esta noite
com o gotejar da chuva
monótono
sonolento.
Dormia comigo a saudade
e comigo acordou
amargando horas sem raízes
no tecer de angústias e desânimos.
Pura fantasia a textura dos sentimentos!
Os galos cantavam ao longe
no romper da madrugada
e a claridade incerta da janela
abria mansamente os meus olhos
intactos
molhados.
Ousei tocar a tua mão branca
sabendo que tocava o lado esquecido da vida.
Tinhas morrido.
Já na véspera o sabia
mas esqueceu-mo o dormir.
Fugi para a cidade
e vagueei pelas ruas adormecidas
até os galos calarem o seu cantar.
Por baixo de um céu de nuvens
levei meus passos para o lado do mar.
As ondas abriam-se nos rochedos negros
e eu não tive medo.
Deixei que as pernas me pesassem
ao longo da praia
em passos leves de areia fina.
Quando levas um seio ao vento
e me dás a beber campos e cidades
glorifico a pouca luz que ainda me resta.
Se os lobos se atravessam
no caminho para a tua cabana
o vento ergue-me nos ares
e o coração aprende a não ter medo de cair.
Descobridor de sonhos
de amanhãs que riem
e de estuários...
continuo a pintar o vento
ainda que nele te vás.
Adão Cruz