Que vens contar-me se não sei ouvir senão o silêncio?
Estou parado no mundo.
Só sei escutar de longe antigamente ou lá para o futuro.
É bem certo que existo: chegou-me a vez de escutar.
Que queres que te diga se não sei nada e desaprendo?
A minha paz é ignorar.
Aprendo a não saber: que a ciência aprenda comigo já que não soube ensinar.
O meu alimento é o silêncio do mundo
que fica no alto das montanhas e não desce à cidade
e sobe às nuvens que andam à procura de forma antes de desaparecer.
Para que queres que te apareça se me agrada não ter horas a toda a hora?
A preguiça do céu entrou comigo
e prescindo da realidade como ela prescinde de mim.
Para que me lastimas se este é o meu auge?!
Eu tive a dita de me terem roubado tudo menos a minha torre de marfim.
Jamais os invasores levaram consigo as nossas torres de marfim.
Levaram-me o orgulho todo
deixaram-me a memória envenenada
e intacta a torre de marfim.
Só não sei que faça da porta da torre que dá para donde vim.
Almada Negreiros