
Num 
sonho de Íris morto a oiro e brasa, 
Vem-me lembranças doutro tempo azul 
Que me oscilava entre véus de tule – 
Um tempo esguio e leve, um tempo-asa 
Então os meus sentidos eram cores, 
Nasciam num jardim as minhas ânsias, 
Havia na minha alma outras distâncias – 
Distancias que o segui-las era flores... 
Caía oiro se pensava estrelas, 
O luar batia sobre o meu alhear-me... 
– noites-lagoas, como éreis belas 
– sob terraços-lis de recordar-me!... 
Idade acorde de inter-sonho e Lua 
Onde as horas corriam sempre jade, 
Onde a neblina era uma saudade, 
E a luz – anseios de Princesa nua ... 
Balaústres de som, arcos de amar, 
Pontes de brilho, ogivas de perfume... 
Domínio inexprimível de ópio e lume 
Que nunca mais, em cor, hei–de habitar... 
Tapetes de outras Pérsias mais Oriente... 
Cortinados de Chinas mais marfim... 
Áureos templos de ritos de cetim... 
Fontes correndo sombra, mansamente... 
Zimbórios-panteões de nostalgias, 
Catedrais de ser – eu por sobre o mar ... 
Escadas de honra, escadas só, ao ar ... 
Novas Bizancios – Alma, outras Turquias... 
Lembranças fluidas ...cinza de brocado ... 
Irrealidade anil que em mim ondeia ... 
Ao meu redor eu sou Rei exilado, 
Vagabundo dum sonho de sereia... 
Mário de Sá-Carneiro