Terra longe
Aqui, perdido, distante 
das realidades que apenas sonhei, 
cansado pela febre do mais-além, 
suponho 
minha mãe a embalar-me, 
eu, pequenino, zangado pelo sonho que não vinha. 
"Ai, não montes tal cavalinho, 
tal cavalinho vai terra-longe, 
terra-longe tem gente-gentio, 
gente-gentio come gente" 
A doce toada 
meu sono caía de manso 
da boca de minha mãe: 
"Cala, cala, meu menino, 
terra-longe tem gente gentio 
gente-gentio come gente". 
Depois vieram os anos, 
e, com eles, tantas saudades!... 
Hoje, lá no fundo, gritam: vai! 
Mas a voz da minha mãe, 
a gemer de mansinho 
cantigas da minha infância, 
aconselha ao filho amado: 
"Terra-longe tem gente-gentio, 
gente-gentio come gente". 
Terra-longe! terra-longe!... 
- Oh mãe que me embalaste 
- Oh meu querer bipartido!
Pedro Corsino de Azevedo (poeta caboverdiano)
